Resenha

INTRODUÇÃO

Desde o início das civilizações humanas, o uso de ervas e plantas passou a ser comum no nosso cotidiano. Diversas plantas tinham e ainda têm, utilidades indispensáveis ao homem: de temperos usados na comida a compostos medicinais, a humanidade sempre usufruiu desses recursos que a natureza oferecia, colaborando para a manutenção da vida e a construção de um saber; saber esse que foi transmitido para as gerações seguintes. O uso de ervas e especiarias na culinária desenvolveu-se, em parte, como uma resposta à ameaça de agentes patógenos de origem alimentar. Estudos mostram que em climas tropicais, onde os patógenos são mais abundantes, as receitas são mais condimentadas. Além disso, as especiarias com poder antimicrobiano mais potente tendem a ser selecionadas. As angiospermas foram a fonte original da maioria das plantas medicinais. Visto isso, cabe ressaltar o percurso histórico do saber de plantas medicinais, a sua descoberta no Brasil, seus benefícios e malefícios.

A HISTÓRIA DO USO DE PLANTAS MEDICINAIS

Desde os tempos remotos, as plantas medicinais têm se mostrado parte da evolução humana e foram os primeiros recursos terapêuticos utilizados pelos povos. Pode-se afirmar que o hábito de recorrer às virtudes curativas de certos vegetais se trata de uma das primeiras manifestações do antiquíssimo esforço do homem para compreender e utilizar a natureza como réplica a uma das suas mais antigas preocupações, aquela originada pela doença e pelo sofrimento. Antigas civilizações têm suas próprias referências históricas acerca das plantas medicinais. Muito antes de aparecer qualquer forma de escrita, o homem já utilizava as plantas, algumas como alimento e outras como remédios. Em seus experimentos com ervas, houve sucessos e fracassos; muitas vezes, estas curavam, mas, outras vezes, matavam ou produziam efeitos colaterais graves.
A descoberta das propriedades úteis ou nocivas dos vegetais ocorreu por meio do conhecimento empírico, ou seja, da observação feita pelos homens do comportamento dos animais, por exemplo. Além disso, existem relatos lendários em que se atribuem às plantas poderes divinos, pois seu uso fazia parte de rituais religiosos que colocavam os homens em contato direto com os deuses. Essas valiosas informações foram sendo, inicialmente, transmitidas oralmente às gerações seguintes, para, posteriormente, com o surgimento da escrita, passarem a ser compiladas e arquivadas. As referências históricas sobre plantas medicinais trazem relatos de seu uso em praticamente todas as antigas civilizações. As primeiras descrições do uso de plantas com fins terapêuticos foram escritas em cuneiforme. Essas descrições são originárias da Mesopotâmia e datam de 2.600 a.C., incluindo óleo de cedro (Cedrus sp.), alcaçuz (Glycyrrhiza glabra), mirra (Commiphora sp.), papoula (Papaversomniferum), carqueja (Baccharistrimera) entre muitos outros derivados de drogas vegetais que ainda são utilizados no tratamento de doenças como gripes, resfriados, melhorar a digestão, combater os gases e ajudar a emagrecer.
Outra referência escrita sobre o uso de plantas como remédios é encon-trada na obra chinesa Pen Ts’ao (“A grande fitoterapia”), de Shen-Nong, de 2800 a.C. Shen-Nong é reconhecidamente o fundador da medicina chinesa, pois a ele são atribuídas as virtudes da descoberta das drogas vegetais e a capacidade de experimentar venenos, estabelecendo a arte de criar ervas medicinais.

O DESCOBRIMENTO DE PLANTAS MEDICINAIS NO BRASIL

No Brasil, o processo do uso das plantas medicinais foi muito influenciado pelas culturas africanas, indígenas e europeias. Os escravos africanos contribuíram muito para a formação de uma tradição de uso de ervas medicinais por meio das plantas que trouxeram consigo, que eram utilizadas em rituais religiosos, e por suas propriedades farmacológicas, empiricamente descobertas. Os milhares de índios que aqui viviam utilizavam uma imensa quantidade de plantas medicinais que existem na biodiversidade brasileira. Os pajés transmitiam o conhecimento acerca das ervas locais, e seus usos foram aprimorados a cada geração. Os primeiros europeus que chegaram ao Brasil se depararam com esses conhecimentos, que foram absorvidos por aqueles que passaram a habitar o país e a sentir a necessidade de viver do que a natureza lhes tinha a oferecer, e também pelo contato com os
índios. No século XVI, o jesuíta José de Anchieta foi o primeiro boticário de
Piratininga, atual cidade de São Paulo. Em 1765, a cidade de São Paulo
tinha três boticários. A Real Botica de São Paulo foi a primeira farmácia
oficial da cidade. Os medicamentos eram, em sua grande maioria, plantas
medicinais. Até meados do século XX, as plantas medicinais e seus derivados constituíam a base da terapêutica medicamentosa. A produção química, que teve início no fim do século XIX, iniciou uma fase de desenvolvimento vertiginoso provindos da elaboração de fármacos sintéticos. Esta maneira tradicional de se tratar as doenças foi vista com retrógrada e sendo, aos poucos, substituída por uma medicina industrializada. Nas duas últimas décadas e acompanhando a medicina de outros países, o Brasil voltou a dar a devida importância para a sua flora e assim para a produção de medicamentos fitoterápicos. Atualmente, as plantas medicinais e os fitoterápicos não são mais considerados apenas terapia alternativa, mas uma forma sistêmica e racional de compreender e abordar os fenômenos envolvidos nas questões da saúde e da qualidade de vida.
Sabe-se que, em regiões de baixo desenvolvimento econômico ou em zonas rurais, a falta de acesso da população aos medicamentos industrializados determina o tratamento das doenças com base no uso de plantas medicinais.
Além disso, os fitoterápicos têm conseguido espaço cada vez maior entre a população. Nota-se, nos últimos anos, que a disposição em trabalhar com fitoterapia tem ressurgido. Na última década, registrou-se um aumento expressivo no interesse em substâncias derivadas de espécies vegetais, evidenciado pelo crescimento de publicações dessa linha de pesquisa nas principais revistas científicas das áreas de química e farmacologia. O consumo de plantas medicinais, com base na tradição familiar, tornou-se prática generalizada na medicina popular. Atualmente, muitos fatores têm contribuído para o aumento da utilização desse recurso, entre eles: os efeitos colaterais decorrentes do uso crônico dos medicamentos industrializados; o difícil acesso da população à assistência médica; a tendência ao uso da medicina integrativa e de abordagens holísticas dos conceitos de saúde e bem-estar.

CARQUEJA

A Baccharistrimera é nome científico da Carqueja, uma planta medicinal que apresenta arbusto ereto, ramificado, de altura variável, podendo atingir até 80cm de altura; folhas bastante reduzidas e ovais; flores masculinas e femininas, amarelas e organizadas em capítulos terminais; fruto do tipo aquênio, linear e glabro e com papilho. Possui em sua composição química óleo essencial com nopineno, carquejal, acetato de carquejilo e sesquiterpenos. Adapta-se bem a vários tipos de solo, crescendo abundantemente em regiões de campos e pastagens em todo o país Sua forma de propagação é por meio de sementes e mudas produzidas por estaquia a partir de ramos.
A Carqueja é uma planta que há muito tempo compõe o arsenal terapêutico, sendo conhecida popularmente, de forma bem variada, como Carqueja, Cacalia Amara, Caclia doce, Carqueja Amara, Carqueja amarga, cuchi-cuchi, quinsucucho, três espigas, Bacanta, Bacárida, Cacaia Amarga, Cacália Amarga, Cacália Amargosa, Carqueja do Mato, Carquejinha, Condamina, Quina de Condomiana, Tiririca de balaio ou Vassoura. Por isso é muito importante observar sua forma física, já que é algo que permanecerá igual em todos os lugares sem tantas variações como acontece com o seu nome.
Dentro desse conhecimento popular a carqueja exerce ação benéfica sobre o fígado e intestinos, em decorrência de seus princípios amargos. Purifica e elimina as toxinas do sangue pela ação diurética que exerce. Tem também propriedades hipoglicemiantes, muito úteis no caso de diabetes. Além de proporcionar bom funcionamento dos intestinos. Experimentos demonstraram baixa toxidade do carquejol. Em outros experimentos observou-se também a redução do colesterol em 5 a 10%.
Devido ao seu efeito dissolvente, diurético e depurativo, a carqueja presta bons serviços também em casos de gota, reumatismo, feridas, chagas venéreas e mesmo em casos de lepra. Para estes fins, além de tomar-se o chá, fazem-se também abluções com decocção forte dessa planta, sobre as partes afetadas.
O gargarejo com decocção da planta dá bons resultados em anginas e inflamações da garganta.
Além das propriedades medicinais, a carqueja também apresenta efeitos: antianêmico, antiasmático, antibiótico, antidiabético, antigripal, anti-inflamatório, antirreumática, aromática, depurativa, diurética, emoliente, estomáquica, hipocolesterolêmica, hipoglicêmica, moluscocida, sudorífica, tonico e vermífuga.
Dentre tantos efeitos benéficos também apresentadas contraindicações e precauções quanto ao uso por grávidas, lactantes, crianças, pacientes com hipotensão arterial ou hipoglicemia. Nesses casos não se deve fazer uso do produto sem orientação médica.

A MEDICINA POPULAR E OS PERIGOS DAS PLANTAS MEDICINAIS

O uso de remédios feitos com flores, frutos, folhas, raízes e tubérculos de determinadas plantas é tão antigo quanto os primórdios da história da humanidade. Asiáticos, europeus, africanos, americanos e australianos sempre buscaram e continuam encontrando nas plantas alívio ou cura para os seus males. Existem várias formas de medicina popular: a fitoterapia, a medicina mágica, a medicina mística ou religiosa, a medicina escatológica ou excretoterapia. Neste caso, a fitoterapia é a que utiliza as plantas medicinais através de chás, lambedouros, garrafadas, ungüentos, purgantes, emplastros, “remédios populares”. Não é porque os fitoterápicos são advindos da natureza que podem ser consumidos indiscriminadamente. A utilização inadequada dos fitoterápicos, como a automedicação, pode gerar uma série de efeitos colaterais.
Os perigos das plantas medicinais relacionam-se com a falta de conhecimento a respeito dos compostos presentes nesses vegetais. Muitas pessoas são adeptas à teoria de que o que é natural não provoca nenhum mal, mas as plantas medicinais devem ser usadas com cautela. Apesar de serem produtos da natureza, as plantas possuem compostos que podem causar danos à saúde. Normalmente, o uso de plantas medicinais ocorre pela recomendação feita por algum amigo ou parente. Entretanto, na maioria dos casos, essas recomendações são feitas sem nenhum embasamento científico, sendo apenas relatos passados de geração para geração.
É importante considerar que as plantas podem sim trazer benefícios, sendo inclusive base de uma grande gama de medicamentos, mas também podem conter substâncias tóxicas, interações medicamentosas (evento clínico em que os efeitos de um fármaco são alterados pela presença de outro fármaco, alimento, bebida ou algum agente químico ambiental), abortos e até mesmo a morte. Além do mais, a maioria das vezes, o uso de plantas medicinais ocorre sem que esse fator seja informado ao médico, pois ainda é muito enraizado o conceito de que produtos naturais não causam danos. Assim, aquilo que deveria curar pode desencadear problemas maiores. Como exemplo de planta medicinal usada indiscriminadamente, podemos citar a carqueja (Baccharistrimera), que, apesar de possuir vários benefícios comprovados cientificamente, é responsável por abortos se usada em altas doses. É de extrema importância que os consumidores de produtos medicinais alternativos façam uma reflexão acerca desta temática, pois é necessário que haja uma maior percepção a respeito do uso de algumas plantas medicinais, de modo que todos saibam que o uso destes produtos sem o reconhecimento de suas características pode causar mais problemas do que soluções para a saúde. Diante do exposto, fica claro que o uso de plantas medicinais, apesar de ter seus benefícios, deve ser feito com cautela.

RISCO COMPROVADO DE ABORTO

O chá da Carqueja ajuda o organismo humano a combater infecções virais, febres e diarreias. As propriedades medicinais desse poderoso chá são rapidamente absorvidas pelo nosso organismo, também contribui para fortalecer o corpo, o sistema imunológico e para purificar o sangue.
Embora seja muito utilizada para fins terapêuticos, o uso indiscriminado dessa erva é proibido durante a gestação, pois pode prejudicar o desenvolvimento do feto. A partir de estudos feitos em ratas, comprovou-se que a planta apresenta riscos que vão desde embriotóxico e teratogênico (má formação congênita), até abortivo. Para entendermos melhor, ao tomar esse chá, pode ocorrer o aumento das contrações uterinas, provocando intensas dores abdominais, podendo haver perda de sangue e, consequentemente, ocorrer o aborto, que por sua vez, pode acontecer de forma incompleta, quando o feto sai, mas os restos dele e da placenta podem permanecer retidos no interior do útero, levando a uma infecção que pode levar a morte da mãe. No entanto, em algumas mulheres o aborto não acontece, mas a toxidade dessa planta pode ser suficiente para causar graves alterações, comprometendo o desenvolvimento motor e cerebral do bebê.
Entretanto, esses riscos se acentuam principalmente durante o primeiro trimestre de gravidez, mas também deve ser evitado no decorrer de toda a gestação.








REFERÊNCIAS
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